Coletivo Martha Trindade e a luta ambiental e pela saúde em Santa Cruz

Wanessa Afonso de Andrade - Coletivo Martha Trindade
Imagem: Acervo Instituto PACS

O Coletivo Martha Trindade é um grupo de jovens que surge em 2016 com o objetivo de realizar medições da qualidade do ar de Santa Cruz, Rio de Janeiro, para produzir dados críticos sobre a quantidade de mate­rial particulado no ar. O coletivo surgiu a partir de um intercâmbio en­tre moradores de Piquiá de Baixo, no Maranhão, e moradores de Santa Cruz, Rio de Janeiro. O objetivo dessas medições era ter dados gerados a partir dos moradores, através do programa de Vigilância Popular em Saúde, idealizado pela Fiocruz, Justiça nos Trilhos e Instituto PACS. Fi­zemos duas rodadas de medições em Santa Cruz que geraram um rela­tório. Através da análise desses dados, constatamos que o ar de Santa Cruz (e de Piquiá de Baixo) é mais poluído do que limite recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Atualmente, o coletivo divide-se nos seguintes eixos: Cidade, Saúde e Meio Ambiente. Atuamos organizando formações, mobilizações e pes­quisas sobre violações de direitos humanos nos contextos de megapro­jetos de empreendimentos, mudanças climáticas, entre outras questões relacionadas aos territórios da Zona Oeste do Rio de Janeiro.

Desde a chegada da Ternium (na época, TKCSA), em 2010, moradores e pescadores perceberam os impactos da instalação já no início. O alaga­mento causado pela mudança de curso do rio no Conjunto São Fernando; a emissão de material particulado (que brilhava e sujava muito as casas) conhecida como chuva de prata, em 2013; a instalação da soleira submer­sa que limitava a passagem das embarcações dos pescadores; o trem de minério que rachava as casas mais próximas… Tudo isso e mais uma série de impactos são observadas há anos. Muitas pessoas da região relatam que os problemas respiratórios e dermatológicos aumentaram e, inclusi­ve, muitos moradores reclamam de dor nos ossos. Além disso, a necessi­dade de limparmos várias e várias vezes nossas casas por conta de toda a poluição, faz com que a jornada das mulheres fique ainda mais pesada.

Para além disso, o direito à cidade que já é comprometido na extre­ma Zona Oeste ficou ainda mais comprometido. A maior siderúrgica da América Latina fez com que a mobilidade urbana ficasse ainda mais comprometida. Trajetos que antes levavam 15 minutos, após a sua ins­talação e operação levam mais de uma hora. Nos horários de troca de turno, diversos ônibus da empresa saem e entram, gerando um trânsito ainda mais caótico. Fora isso, a utilização de caminhões faz com que o asfalto fique muito danificado e não há reparação (a não ser em épocas próximas às eleições).

Juntando todos esses fatores, Santa Cruz é um bairro em que já é difícil conseguir atendimento médico e, quando precisamos nos deslocar pelo Rio de Janeiro para algum tipo de encaminhamento de urgência, o traje­to é extremamente longo e penoso. Para além disso, não há diagnóstico efetivo de problemas respiratórios na região. As unidades básicas de saúde receitam o antialérgico mas não dão laudo e não se propõem a investigar o motivo pelo qual tantos moradores possuem problemas respiratórios e a razão pela qual a taxa de mortalidade da Covid-19 na região é tão alta e afetou tantas pessoas que aparentemente não possuíam comorbidades

A verdade é que ainda não conseguimos construir um forte nexo causal entre os impactos da siderúrgica e a saúde dos moradores por falta de uma pesquisa epidemiológica efetiva na região. Mas os fatos são os fatos: mui­tas pessoas possuem (e até faleceram) por conta de problemas respirató­rios. A taxa de mortalidade da Covid-19 no início da pandemia na região foi alta – tanto pela predisposição dos moradores a problemas respirató­rios como pelo fato de não termos parado de trabalhar presencialmente. Nossa luta segue firme e continuará seguindo. Para que todas as leis am­bientais sejam cumpridas, para que tenhamos moradia e saúde dignas e para que os moradores afetados sejam indenizados.

Imagem: Acervo Instituto PACS

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