No dia 22 de março é lembrado como o Dia da Água, porém estamos longe de comemorar este dia. Dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), apontam que cerca de 7,1 mil piscinas olímpicas de água tratada são desperdiçadas por dia, o que representa cerca de 6,5 bilhões de m³ por dia da água destinada à população. O mais impressionante é saber que grande parte é contaminada ou perdida no processo de distribuição, através de vazamentos pela falta de manutenção adequada, desvios ilegais, ou seja, antes mesmo da água chegar às casas. Portanto, é necessário, sim, falarmos de desperdício e consumo consciente da água pelo consumidor final, mas, mais do que isso, é necessário falar sobre políticas públicas que garantam que estes processos não desperdicem águas e, consequentemente, encareçam o preço da água para quem paga por ela.
Em uma sociedade capitalista, que se apega ao preço das coisas e não ao verdadeiro valor delas, será que a privatização da água foi o melhor caminho? As empresas que compraram os blocos da Cedae, não a fizeram com o intuito de garantir o direito humano ao acesso a água potável e sim, visando lucro. Portanto, a privatização não vê o valor da água e sim o preço. Quanto será faturado? Os processos diante de uma privatização ficam limitados ao lucro, ou seja, se não houver lucro não se faz. Que empresário pagará para você ter acesso a água sem que ganhe nada por isso? Ele pode até fazer isso desde que haja lucro. Em parte, é até justo, todo trabalhador ter ser salário, isso é digno, porém empresários multimilionários, que querem lucros cada vez maiores não estão preocupados com o acesso a água e sim, com o quanto ganharão com isso: é aí é onde mora o problema das privatizações.
Precisamos entender que já pagamos pela água quando pagamos nossos impostos, porém, o Estado, através de seus órgãos públicos, deveria garantir que a água chegasse a todas as pessoas e, havendo necessidade de aumentar o investimento para que isso ocorra, deveria ser feito. Isso não acontece com empresas privadas; com estas, o que norteia o pensamento é justamente o lucro. Quanto eu vou ganhar se investir para que a população receba água de qualidade em sua casa? Ou quanto eu devo investir para ter o lucro que desejo? Portanto se o investimento necessário para um abastecimento de água adequado não estiver de acordo com os interesses destes empresários, não será investido. Não importa se eu e você estivermos sem água. Se quisermos ter água teremos que pagar novamente e com a tendência de que estas cobranças sejam cada vez maiores!
O que fazer? Esta é uma pergunta que muitos de nós fazemos e gostaria aqui neste artigo de fazer dois apontamentos. Neste sentido, a primeira coisa a ser feita é tratar o acesso a água potável como um direito humano e não como mercadoria. Água não é mercadoria! Tratar água como mercadoria é desumano. Nosso corpo é composto por 70% de água. Sem água não há vida! A vida que deveria ser “de graça”, se nos aprofundarmos neste assunto, perceberemos que uns estão pagando para viver, outros pagando para sobreviver e no que diz respeito à negligência do abastecimento e qualidade da água, dados coletados do Sistema de Informação de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano, do Ministério da Saúde (SISAGUA), 763 cidades brasileiras, trazem substâncias químicas perigosas e em níveis alarmantes, onde podemos concluir que muitos de nós estamos pagando para morrer. Portanto água não pode ser tratada como mercadoria.
Imagem: Rejany Ferreira
O segundo apontamento que posso fazer é sobre investimento. Quando falamos em investimento logo pensamos em educação ambiental, estruturas, manutenção, todas estas coisas também são muito importantes, porém me refiro a um investimento inicial em gestão pública. Explico: se o Estado entrega nossos recursos naturais nas mãos de empresas para elas administrarem e elas investem pesado nisso, é porque dá lucro a elas, muito lucro por sinal, senão não o fariam. Porém, este lucro vai para o bolso dos próprios empresários investidores e não para o Estado, ou seja, um lucro que poderia voltar para o estado e ser reinvestido beneficiando cada vez mais o contribuinte, está indo “de ralo” para o bolso de grandes empresários, os deixando cada vez mais ricos, enquanto temos pessoas sem água para suas necessidades básicas.
Diante disso, vemos que o problema não está nos recursos e sim na administração. Se uma empresa consegue administrar e extrair lucro, por que o Estado não consegue? A conclusão lógica, então, é a de que há necessidade de investimento em gestão pública, para que o lucro seja reinvestido no próprio Estado e quem ganhe seja o consumidor final com uma água de qualidade, bem como o próprio Estado que, com um abastecimento adequado desperdiçará menos, podendo futuramente realocar recursos em outras áreas como educação, cultura, esporte e lazer, geração de empregos e outros.
O terceiro apontamento é barrarmos os processos de votações no Congresso Nacional onde o chamado “Pacote da destruição” segue. Se aprovado, afetará ainda mais nossos recursos naturais, as administrações públicas e abre caminho para maiores contaminações como a proposta absurda de fim do licenciamento ambiental, os projetos de lei “PLs da Grilagem”, o “Pacote do Veneno” e a legislação que praticamente impede o reconhecimento de Terras Indígenas por meio do marco temporal. Água é um direito, precisa ser garantida com qualidade pelo Estado de forma justa e equânime para a toda população sem distinção de classes sociais.