“Eles nunca disseram nada para nós”

Arlete Roque, mãe de Alex Júlio Roque, desaparecido após abordagem policial em Manaus
Weverton Marinho, Alex Júlio Roque e Rita de Cássia – Foto: Acervo Pessoal Arlete Roque

Já se passaram seis anos e nunca tive o direito de enterrar o meu próprio filho. Apenas nesse caso, são três famílias que ficaram todas doentes. A mãe de Weverton já teve várias doenças; a mãe e o pai de Cássia também já tiveram diferentes enfermidades, tais como Acidente Vascular Cerebral (AVC) e trombose. O pai de Alex sofreu com um AVC e aneurisma. Assim como os outros pais, toma remédios fortíssimos. Permanece, assim, a nossa indignação com o fato de que o Estado continua matando nossos filhos, ocultando seus cadáveres e nos matando junto, afinal, somos três famílias que sofrem com doenças, com depressão, com angústia.

O que quero pedir é que parem de matar os nossos filhos! Até agora,não tivemos acesso nem aos atestados de óbito. Além disso, estamos esperando por uma indenização que só Deus sabe quando vai sair.

No meu caso, fiquei sabendo do ocorrido às 3h45, quando os irmãos de Cássia chegaram dizendo que os meninos haviam sido levados por oito policiais. Caímos em desespero, mas começamos a correr atrás para saber para onde eles haviam sido levados. Procuramos o dia todo, mas não achamos. Meu marido achou a sandália do meu filho, cheia de sangue, na localidade conhecida como “Mestre Chico”. Lá, ele também achou duas cápsulas de balas que saíram das armas dos policiais, porém, não encontramos os corpos.

Os oito policiais acusados foram julgados, ficaram presos por dois anos e oito meses, mas saíram com tornozeleiras eletrônicas. A justiça autorizou a saída deles “para trabalhar, para levar o sustento para seus familiares”. Mas quem vai levar o sustento do filho que o Alex deixou? Hoje, quem ajuda na criação do meu neto sou eu. Ele tem uma deficiência na perna e precisa fazer uma cirurgia urgente. Também nesse caso, contar com o Estado é o mesmo que nada, já que ele nunca concedeu nenhum benefício ao meu neto.

Arlete Roque durante manifestação contra a violência policial – Foto: Acervo pessoal de Arlete Roque

O mesmo Estado que paga os salários desses policiais nunca nos assistiu em nada. Nunca tivemos um acompanhamento de saúde, nunca tivemos acompanhamento psiquiátrico ou psicológico, nada. Meu marido já teve quatro AVCs, e eu que corri atrás. O certo era o Estado estar nos assistindo, mas nunca recebemos nada. Nunca disseram nada para nós, a não ser que: nem Deus vai achar o corpo dos meninos. Com certeza os meninos foram jogados no rio ou então foram carbonizados. Nunca falaram onde colocaram os meninos. Não sei se há algum cemitério por aqui, se eles os enterram clandestinamente. O que sei é que a saúde das famílias está precária, as famílias estão doentes.

Dizem que os meninos eram traficantes, eram marginais, mas eles eram de família. Não importa o que eles eram, por mais que fossem os piores marginais, jamais poderiam ter sumido com os corpos e ocultado os cadáveres. Essa é a atitude de um Estado genocida, que mata e continua matando. Há cerca de dois meses a ROCAM (Ronda Ostensiva com Apoio de Motocicletas) matou mais quatro pessoas. A matança continua.

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