Não queremos morrer nem de bala, nem de Covid. Só queremos viver!

Bruna Silva, moradora da Maré
Imagem: Acervo Pessoal Bruna Silva

Me chamo Bruna da Silva, tenho 39 anos, sou nascida e criada no conjunto de favelas da Maré. Sou mãe de 2 filhos, mas devido à violência da segurança pública meu primogênito foi morto enquanto usava seu uniforme de escola e nas costas carregava sua mochila cheia de material escolar. Marcus Vinicius foi assassinado com um único tiro de fuzil dado pelas costas. Meu filho foi morto por quem deveria proteger e abrigá-lo. Meu filho foi morto por um agente do estado em uma operação ilegal aqui na Maré.

Meu filho viu quem foi o autor daquele tiro e me contou horas antes de vir a óbito. Me lembro que meu filho me perguntou: “Mãe, o que eu fiz para que a polícia me desse um tiro? O que foi que fiz, mãe? Eu só queria tentar voltar para casa, mas a polícia não deixou”. Marcus Vinicius, meu filho, virou minha inspiração para a luta. É por ele e por todos que eu sigo nas ruas gritando e dizendo que nossas vida importam!

Parem de nos matar, deixem os nossos filhos viverem. A lógica da vida é os filhos enterrarem seus pais, mas o que eu vejo é um genocídio do povo negro pobre e favelado. Nossas vidas, nossas famílias deveriam ser blindadas.

Já vai para 3 anos de impunidade e nada foi feito.

O que eu vejo são outras mães, assim como eu, nascendo da dor da bala que tira a vida dos nossos filhos. Mataram o meu aos 14 anos de idade e ainda continuam por aí matando mais e mais crianças. Eu pergunto: que país é esse? Onde é que o nosso Brasil vai parar?

Imagem: Acervo pessoal Bruna Silva

Cadê os governantes que nada fazem para colocar freio a tantas mortes? Cabe a nós, mães que fizeram do seu luto uma grande luta, gritar que nossas vidas, as vidas dos nossos filhos importam. Nossos filhos sempre tiveram mães, hoje os nossos mortos têm voz.

Quando não é a bala do estado que mata é a Covid. Estamos em uma pandemia mundial e, mesmo assim, o estado continua entrando nas favelas e matando os nossos corpos negros e pobres.

Queremos um basta! Basta de violência, nossas vidas importam! Queremos uma segurança pública que garanta a vida e não que nos mate. Queremos o direito à vida. Nem o dias das mães temos mais, porque a gente olha para traz e vemos que não tem o que ser comemorado. O que eu vejo são mães enterrando seus filhos até no dia das mães. Queremos um basta! Basta de violência, nossas vidas importam! Queremos uma segurança pública que garanta a vida e não que nos mate. Queremos o direito à vida. Nem o dias das mães temos mais, porque a gente olha para traz e vemos que não tem o que ser comemorado. O que eu vejo são mães enterrando seus filhos até no dia das mães.

Imagem: Acervo pessoal Bruna Silva

O caso do Jacarezinho não foi operação, foi uma chacina onde 28 mães de uma só vez perderam e tiveram que enterrar os filhos. Eram tantos gritos de dor e choros!
O estado deve prender, não matar. Nas favelas não temos fábricas de armas, não temos plantações de drogas. Aí eu pergunto: como é que essas coisas chegam dentro das favelas? Por que as operações não são feitas nas fronteiras, porque é de lá que essas coisas vêm? Aí o estado deixa passar nas fronteiras para que eles tenham um motivo para entrar e matar.

A mãe do bandido não criou seu filho para ser bandido. Mãe é mãe. Mãe nenhuma vai jogar um filho para o alto. Mãe ama, mãe cuida. A mãe do bandido merecia ver seus filhos vivos e presos, pagando pelos seus crimes. Pelo crimes dos filhos a mãe não tem culpa. Eu não desejo essa dor nem para a mãe do policial que tirou a vida do meu filho.

Tem policial que morre também, mas a culpa não é nossa. A culpa é dos governantes que expõem e não cuidam de suas tropas. Tem policial adoecendo e morrendo também. Minha solidariedade a essas mães que por culpa dessa guerra de caça as drogas estão perdendo e enterrando seus filhos.

Antigamente eu via um rastro de sangue, hoje o que eu vejo é um rio de sangue. Sangue inocente e sangue culpado.

Hoje eu tenho apenas uma filha, de 15 anos, mãe de dois filhos. Olho para minha filha e vejo que ali está faltando um, o que falta é o irmão dela.

Minha filha hoje cresce sozinha, porque não tem mais o convívio do irmão, do amigo; porque eles eram muito apegados, dormiam juntos, comiam juntos. Era tão bom ver meus filhos juntos, nunca pensei que um dia eu teria um filho morto pelo braço forte e armado do estado.

Queremos uma segurança pública que garanta a vida! Queremos que tenha justiça nas mortes dos nossos filhos! É preciso que tenha investigação nas mortes dessas crianças.

Sem justiça não haverá paz, seguimos nas ruas cobrando justiça.

Minha solidariedade às mães que não têm mais os seus filhos.

Queremos ser vacinados merecemos o direito de ter vacina.

É preciso também desbancar esse discurso de que bandido bom é bandido morto. É esse discurso que está contribuindo para essas mortes de crianças e jovens. Estamos vivendo um momento de faroeste caboclo nas favelas, é um bang bang só, e nós e nossos filhos no meio desse fogo cruzado.

Imagem: Acervo pessoal Bruna Silva

O estado não se importa com nossas vidas, eles entram violando os nossos direitos e muita das vezes eles violam o direito a vida.

Não queremos morrer nem de bala e nem de Covid. Só queremos viver!

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